Venho recebendo muitas perguntas sobre o que significa ser deslocada climática e como esta atrelado a tragédia climática que vivenciei em Petrópolis, em fevereiro de 2022, fica evidente como temas essenciais passam batido, são invisibilizados, só temos holofotes quando há carnificina, como foi em Petrópolis, mais de 230 mortos, 1 segue desaparecido, mais de 3 mil famílias desabrigadas, 170 pontos de deslizamentos e só estivemos nos jornais enquanto havia números e números de corpos soterrados, hoje, quase 10 meses depois pouco se fala sobre, esquecida para o Brasil mas ferida presente em todos aqueles que perderam suas famílias, filhos, mães, amigos, e como eu, foram forçados a migrar por conta da tragédia.
Petrópolis, região serrana do Rio de Janeiro foi cenário do pior desastre causado pelas chuvas até então na cidade, em 1988, que deixou 171 mortos, número infelizmente superado dia 15 de fevereiro de 2022, que findou a vida de mais de 230 pessoas.
A maior quantidade de chuva registrada tinha sido em 1952, quando choveu 168,2 milímetros em 24 horas; dia 15 de fevereiro foram 259,8 milímetros em apenas 6 horas, um recorde desde que o Instituto Nacional de Meteorologia passou a fazer a medição, em 1932.
Enquanto onde eu morava enchia até o segundo andar, o morro da oficina vinha abaixo, carros com pessoas dentro arrastados pela água colidiam nos muros do condomínio, corpos boiando na Estrada União e Indústria e um completo pavor e impotência.
Desafio imenso tentar mensurar aqui os danos físicos, sem incluir os danos psicológicos que ainda sigo digerindo, por diabos, eu passei por uma tragédia climática que me forçou a mudar de Estado, me forçou a recomeçar.
Esse é artigo trazer para a luz esse tema e principalmente, provocar a proposição de agendas de garantia de direitos fundamentais para esses grupos, o qual eu e minha família hoje também fazemos parte.
Segundo matéria especial da Leia. A Observatório, em 2019, eram estimadas 33,4 milhões de novas vítimas de deslocamentos ambientais e internos forçados no mundo.
DESLOCADOS CLIMÁTICOS X REFUGIADOS CLIMÁTICOS
Os deslocados ambientais e climáticos entram na categoria de migração forçada que inclui os atingidos por catástrofes climáticas, ambientais, naturais ou provocadas, que inviabilizam a vida em seus locais habituais de residência, mas que não chegaram a atravessar fronteiras internacionais – ao contrário da ideia de “refugiados ambientais”, como eles continuam no próprio país, seguem sob a proteção do Estado e das garantias constitucionais, que é o que deveria ser mas não é, ausente de proteção dos regimes internacionais e com pouca proteção dos governos nacionais de onde migram e onde buscam acolhimento. Os deslocados ambientais (para alguns, deslocados ambientais ou climáticos) são caracterizados como migrantes forçados, por se deslocarem de seu local de origem em busca de sobrevivência, sem escolha entre ir ou permanecer.
No meu caso, por exemplo, eu e minha família nunca recebemos nenhum apoio do Estado, repito, NENHUM.
Já o termo ''refugiados ambientais” foi criado em 1985 pela ONU Meio Ambiente, se referindo às “pessoas que foram forçadas a deixar seu habitat tradicional, temporária ou permanentemente, por causa de uma perturbação ambiental acentuada (natural e/ou desencadeada por pessoas) que comprometeu sua existência e/ou afetou seriamente a qualidade de vida, saindo de seus países de origem.
Segundo o livro Deslocados Ambientais de Marcos Galli, publicado ano passado, até a data da publicação não existia definição jurídica sobre os deslocados e qual seria o regime de proteção de direitos ao qual estariam sujeitos, diante da ausência de norma reguladora, observam-se duas vertentes teóricas na busca pela resolução do problema: a categorização dos deslocados como uma nova forma de migração, dotando-os de personalidade jurídica própria; ou a vinculação normativa emergencial com legislação preexistente, enquadrando-os como refugiados, utilizando, para tanto, a definição ampliada de refúgio, e em pesquisas até o momento presente continua sem definição jurídica, sem direitos amparados.
Mas quem são essas pessoas?
Andrea Pacheco Pacífico, professora da Universidade Estadual da Paraíba e co-coordenadora da Cátedra Sérgio Vieira de Mello da Agência da ONU para Refugiados (Acnur), explica que não há uma definição legal (nem formal ou operacional) consensualmente aceita para se referir a essa categoria de pessoas em situação de mobilidade. “Prefiro utilizar o termo ‘deslocados ambientais’, pois assim diferencio deslocados (quando a mobilidade é forçada) de migrantes (que uso para situações em que há a vontade do indivíduo, por questões econômicas ou outras). Há os deslocados internos (que não cruzaram as fronteiras geográficas de um país) e os internacionais (que cruzaram fronteiras), e também os deslocados por alteração no meio ambiente em que viviam, independentemente de a causa ter sido natural (como terremotos e tsunamis), antrópica (como nas tragédias de Mariana e Brumadinho) ou mista”.
Conheci o NEPDA logo após a tragédia, e descobri que o Núcleo de Estudo e Pesquisa sobre Deslocados Ambientais nasceu para categorizá-los, mapear seus locais de origem e de destino, analisar os conflitos surgidos em decorrência do deslocamento e as questões de segurança (humana, estatal e ambiental) aplicadas ao dilema, além de examinar a proteção concedida a eles e as políticas públicas adotadas, em nível doméstico e internacional, comparando as diversas formas de apoio e os atores envolvidos no processo, os quais serão de fundamental importância para inferir possibilidades de regulamentação de proteção dos deslocados ambientais, com o fim de melhorar as relações entre os diversos atores internacionais, estatais e não estatais, no atual sistema internacional.
Assim como O Relatório Global sobre Deslocamento Interno do IDMC, que é o repositório oficial de dados e análises sobre deslocamento interno. O GRID deste ano divide os dados por conflito, violência e desastres em 145 países. Esta edição analisa as políticas e práticas operacionais em todo o mundo e mostra o que está sendo feito pelos países para prevenir, responder e resolver o deslocamento interno. O GRID2020 propõe um roteiro para a próxima década com base em melhores informações, mais recursos e maior investimento político.
Das 358 mil pessoas deslocadas no Brasil entre 2019 e 2020, 75% foram vítimas das chuvas de verão, e segundo cálculos do IDMC com base nos dados do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres do Brasil, durante o mês de outubro de 2022, 96 pessoas foram deslocadas pela seca no estado do Piauí, e 90 pessoas foram deslocadas pela seca no estado de Pernambuco (clique aqui para ler na íntegra
Precisamos de definição jurídica e de legislação para a garantia de direitos fundamentais para deslocados e refugiados climáticos/ambientais.